Entrevista com Larissa Palmieri e Al Stefano sobre “O Fantasma da Ópera em São Paulo”

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E se o Fantasma da Ópera se passasse dentro do Theatro Municipal de São Paulo?
 

O quadrinho O Fantasma da Ópera em São Paulo reimagina o clássico francês de Gaston Leroux na capital paulista. Acrescente a isso uma estética Steampunk, o contexto da Semana de Arte Moderna de 1922 e a visão inventiva de Larissa Palmieri e Al Stefano.
 

Publicado pelo Selo Zapata Edições, o quadrinho apresenta a história da trágica relação entre uma faxineira que sonha em ser solista, um mimado jovem da elite paulistana e uma estranha e perigosa assombração que habita o Theatro Municipal.
 

Para conhecer mais sobre o processo criativo do quadrinho, conversamos com os autores da obra. Confira:
 

O Fantasma da Ópera em São Paulo reimagina os personagens do clássico francês de Gaston Leroux na capital paulista. Como surgiu esse projeto? Houve algum estímulo em particular para a criação do quadrinho?
 

LARISSA — Sou muito fã do musical e do livro desde muito jovem, então O Fantasma da Ópera sempre esteve nas minhas referências e definiu muito do meu imaginário como autora. Sobre a ideia em si, foi algo muito natural ao ouvir as faixas do musical durante um dia de trabalho em uma empresa em São Paulo. À época, ainda morava no ABC Paulista e há uma fascinação diferente a respeito da cidade para quem é de fora e não mora muito perto do centro da cidade, onde a história acontece. Hoje moro na capital.
 

AL STEFANO — Acredito que a Larissa pode contar isso melhor do que eu, mas resumindo: éramos vizinhos de mesa numa CCXP, já nos conhecíamos é claro, e conversa vai, conversa vem, levantamos a ideia de fazermos uma HQ de terror juntos. Minutos depois, a Larissa revelou sua paixão de infância pelo O Fantasma da Ópera e daí foi só engatar o projeto.
 

A narrativa se passa na década de 1920, em São Paulo, mais especificamente na Semana de Arte Moderna de 1922, e conta com a presença de figuras ilustres à época. Pensando no contexto, quais preparações e pesquisas se fizeram necessárias para representá-lo?
 

LARISSA — O projeto foi vencedor de um edital de fomento à cultura do Estado de São, o ProAC de 2021. Por uma feliz coincidência, o tempo de elaboração do quadrinho foi durante as comemorações do centenário da Semana de Arte Moderna, então uma vasta programação cultural e diversos conteúdos jornalísticos estavam disponíveis durante a pesquisa e concepção do roteiro. Tive a oportunidade de fazer visitas guiadas não apenas ao Theatro Municipal como também a diversos locais da cidade de São Paulo que tiveram relevância para os modernistas e eles aparecem em algumas ocasiões na história.
 

AL STEFANO — Da minha parte, por ser o visual do projeto, fiz pesquisas de campo, visitas ao Theatro Municipal, fotografias de arquivos da cidade da época, livros sobre designer Steampunk e por aí vai.
 


 

Larissa, você já havia assinado o roteiro de duas adaptações de clássicos – Frankenstein Anne de Green Gables -, no quadrinho, reimaginou mais um. Como as suas experiências anteriores contribuíram para esse trabalho? E quais considera as possibilidades — e responsabilidades — de uma adaptação livre?
 

LARISSA — Essa é uma curiosidade peculiar sobre o meu trabalho com adaptações literárias, pois tive a ideia de fazer a de O Fantasma da Ópera antes de ser convidada para roteirizar as duas outras. O pitch e o projeto foram definidos em 2019, tendo algumas pequenas alterações nos anos seguintes até conseguirmos de fato sermos selecionados para o ProAC. Nesse meio tempo pude fazer Anne e o Fantasma e, de fato, foi uma ótima preparação para saber como seria o meu processo trabalhando a história de outros autores tão importantes e consagrados.
 

Sobre a adaptação livre, realmente explorei mais essa possibilidade no caso do Fantasma, já que as outras duas se mantêm um tanto mais fiéis até mesmo por ser a proposta do projeto do Selo Principis, onde o Frankenstein e Anne saíram. E sim, é uma responsabilidade ainda maior, pois o Fantasma já foi adaptado diversas vezes em formatos e épocas diferentes. Mas o que eu realmente sentia falta em todas as adaptações que pesquisei era um ponto de vista em que a voz mais ativa fosse a de Cristina. Acho que aqui foi meu movimento mais ousado, em especial por ter mudado o contexto social em que a história acontece.
 

Al Stefano, o quadrinho tem uma pegada da estética Steampunk, como foi trabalhar isso? Houve algum elemento novo em seus estudos e técnicas em relação aos seus trabalhos anteriores?
 

AL STEFANO — Achamos que esta estética teria tudo a ver com a proposta da história. Como já estávamos recontando um contexto histórico acoplado por uma ficção literária, por que não ambientar tudo isso nessa atmosfera misteriosa do vapor e engrenagens? Iniciei as pesquisas sobre a estética, com ajuda da Larissa, e o estilo de página, traço e acabamento foi surgindo naturalmente. O resultado foi um material visual totalmente novo em relação aos meus trabalhos anteriores, e bem diferente do que foi pensado no início do projeto. Uma das preocupações da Larissa era em manter o clima de terror da história original, isso me fez repensar algumas coisas sobre sombras, brushes e quantidade de detalhes. Eu diria que a história foi se moldando sozinha. Quando eu olho as páginas hoje, tenho sensações diversas. Acho que deveria ter carregado mais na estética Steampunk, acho que deveria ter distorcido menos os personagens, acho isso, acho aquilo, etc. Mas na verdade o que me incomoda é que a história acabou fugindo do meu controle, então eu relaxo e fico satisfeito com o resultado.
 

Quais foram as principais transformações em relação aos seus interesses e percepções sobre a linguagem dos quadrinhos ao longo dos anos?
 

LARISSA — Hoje me sinto mais preparada para fazer histórias mais longas e aprendi a respeitar o tempo das coisas. Acho que meus quadrinhos, até o momento, sempre foram muito apressados por questões externas e limitações de diversas naturezas. Entendi que um bom gibi demanda mais espaço e paciência. Meu objetivo é conseguir contar uma história totalmente autoral e com um bom número de páginas que me deixe satisfeita como criadora. Comecei a publicar em 2017 e ainda sinto que vou atingir a maturidade necessária para tal quando finalmente conseguir elaborar um trabalho mais complexo e refinado dentro dos meus termos. No momento, ainda sinto que estou subindo cada degrau para isso e é sempre uma pequena vitória como autora. Também não me sinto mais presa aos gêneros pelos quais sou mais conhecida, como terror e ficção científica, e acho que posso falar sobre outras coisas também. Menos humor, humor não é muito minha praia.
 

AL STEFANO — O amadurecimento como artista, é claro, vem no pacote. Mas acho que a principal transformação foi a constante mudança do olhar em relação aos trabalhos dos colegas. Quando comecei a produzir quadrinhos, achava que eu tinha a fórmula mágica para resolver qualquer história, tema e conceito. Porém, quando eu imergi na cena com mais profundidade, vi um mundo aberto de possibilidades sem fórmulas e regras. O período que passei tentando ser aprovado no mercado americano (lá nos anos 90) me obrigou a consumir uma estética e um pensamento sobre quadrinhos específicos para um mercado. Veja bem, não estou dizendo que isso é bom ou mau, somente que isso me engessou bastante por conta da minha visão tacanha de quadrinhos como um todo. Atuar no mercado independente com a diversidade fantástica de artistas, ideias, mundos, sem barreiras, sem alguém para dizer que seu desenho está certo ou errado, foi e é libertador. E acredite, minha arte só evoluiu neste período.
 

Vocês estão trabalhando em algum novo projeto em particular?
 

LARISSA — Sim, atualmente estou trabalhando em uma história de horror, ainda não anunciada, que deve sair no fim do ano que vem por editora. Além disso, devo falar em breve mais sobre a versão impressa e limitada de Colheita, um quadrinho com meu texto e desenhos de Rafael Calça, que originalmente foi publicada de forma muda no Instagram e agora sairá impressa acompanhada de texto. E, claro, sempre tem novos projetos que ainda estão tomando forma.
 

AL STEFANO — Estou desenvolvendo um novo ProAC que peguei agora em 2023 e preparando terreno para o Piratas do Cangaço volume 2.


#Quadrinhos   ; ; ; ;


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