Preconceito e ancestralidade: Papo com Ricardo Tayra sobre “Amarelo Seletivo”

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 Ricardo Tayra é neto de japoneses, TalessaK é bisneta de japoneses. Juntos eles assinam o mangá Amarelo Seletivo. A ancestralidade de ambos é um ponto essencial em uma narrativa que traz como protagonista um garoto nipo-brasileiro aprendendo a lidar com o preconceito e a sua identidade asiática.  

 

Passado no Brasil, nos anos 80, o quadrinho acompanha André, uma criança de 10 anos que, ao mesmo passo que lida com a mudança de escola, começa a perceber o tratamento diferente que sofre por conta de sua origem.  

 

Misturando ficção e acontecimentos de sua própria infância, Ricardo Tayra pensou o roteiro da história como uma homenagem aos seus antepassados. E para tal, decidiu chamar uma ilustradora também de ascendência nipônica. Para saber mais sobre a criação de “Amarelo Seletivo”, conversamos com o quadrinista:  

 

 

Como você define “Amarelo Seletivo”?

 

Ricardo: Para mim, essa HQ é, primeiro, a realização de um sonho. Já fazia muito tempo que eu queria lançar uma revista, mas sempre algo atrapalhava a escrita do roteiro e eu nem tinha a pessoa para as ilustrações ainda. Há muitos anos, cheguei a produzir roteiros sob encomenda para um estúdio, mas ainda não tinha feito nada autoral desde a época em que eu lançava zines, quando criança. 

 

Fiquei elaborando na cabeça que deveria concretizar meu primeiro roteiro contando algo relacionado à minha ancestralidade japonesa. Também tinha vontade de contar um pouco como foi a minha infância nos anos 80 e calhou que tudo se juntou meio que naturalmente no início do ano passado.  
 

Quando eu procurei a TalessaK para saber da disponibilidade dela, eu ainda nem tinha terminado de escrever o roteiro. Mas saber do interesse e disponibilidade me ajudou a acelerar a produção. Eu já conhecia o trabalho dela, sabia o quanto era profissional, também sabia que precisava de uma artista de ascendência japonesa e seria bacana que fosse uma mulher para permitir um olhar complementar à minha visão masculina. Pois chegamos a um acordo sobre a encomenda e deu tudo muito certo. 

 

Eu também já imaginava viabilizar a impressão com uso de financiamento coletivo, o crowdfunding. Nesse processo, basicamente os leitores apostam na concretização de um projeto, com diversos valores, e recebem recompensas em troca – no caso, a principal foi a edição impressa. Deu tão certo a arrecadação que eu aumentei a tiragem originalmente prevista. Produzi um excedente que é o que sigo vendendo por meio do site: www.amareloseletivo.com.br . A revista também é a primeira publicação do meu selo Sapos Voadores, que se originou num blog criado em 2006 e agora abriga meus projetos e textos quadrinísticos. 

 

Pode nos falar um pouco como foi o processo criativo? 

 

Para compor o André e o básico da história, me inspirei em mim mesmo e em coisas que aconteceram comigo quando criança. Tendo uma ideia melhor sobre o personagem, pude acrescentar elementos ficcionais para melhorar alguns aspectos do enredo e ritmo. 

 

Depois de cozinhar a ideia por bom tempo na cabeça, escrevi quase tudo de uma vez. Aí tive que matutar durante umas boas semanas pra refinar aqui e acolá e escrever o restante (a demora por conta da falta de tempo mesmo, já que a produção de quadrinhos não é minha atividade principal). 

 

A quadrinista TalessaK

A primeira versão ficou pronta em 5 de junho de 2021. A partir daí, foi um período pra afinar algumas coisas, mostrar o roteiro a alguns amigos de confiança e ouvir suas opiniões sinceras e embasadas, fazer novos ajustes. A versão 3 do roteiro foi a que compartilhei com a TalessaK em 20 de junho, para trocarmos figurinhas e definirmos melhor o escopo do trabalho. O roteiro final foi a quinta versão, que recebeu sinal verde para produção em 22 de julho.  

 

Trocamos algumas mensagens e fizemos uma videoconferência pra definir detalhes. Por conta da pandemia, trabalhamos à distância e eu só tinha noção do andamento quando ela me escrevia. Então, cada nova mensagem dela, com alguma dúvida, ou novos esboços, era muito comemorada por mim! 

 

Curiosidades: depois do contato inicial via Messenger, do Facebook, nossa principal forma de comunicação foram e-mails. Contabilizei ao final do processo 296 mensagens, divididas em 25 trocas de e-mails. 

 

O quadrinho terá continuação? 

 

Não foi algo que tive certeza logo de saída, mas hoje digo que esta HQ terá continuação. Estou demorando mais do que gostaria, esbocei muitos rascunhos, mas ainda não sei bem quando terei o definitivo. A forma como a campanha foi bem recebida, os contatos das pessoas agradecendo e querendo contar suas próprias histórias de vida, tudo isso se somou à vontade que eu já tinha de escrever algo maior. Assim que eu conseguir terminar veremos em relação às ilustrações: eu gostaria de contar novamente com a TalessaK, mas dependerá de um novo acerto e disponibilidade. Veremos!  


#Quadrinhos   ; ; ;


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