Criado por Francylene Silva - 29 de novembro de 2019 às 19:18
Viajantes do Abismo é sobre o fim, e também sobre esperança. É sobre medo, e também resistência. É sobre agir, e também sobre amar.
Escrito por Nikelen Witter (“Alcova da morte”), o livro tem tantas camadas quantos gêneros para descrevê-lo sendo uma mistura de fantasia, steampunk e distopia.
Narrado em terceira pessoa sob a perspectiva de Elissa, Em Viajantes do Abismo, o avanço dos desertos é responsável pela morte gradativa do planeta. Apesar de estar evidente os prejuízos que causam as tecnologias a vapor e a forma desregrada cuja a natureza está sendo explorada, muito mistério rodeia os motivos do rápido avanço.
A presença da magia aparece ainda como uma grande virada narrativa. As lendas e histórias antigas aparecem muito maiores que apenas histórias para crianças. E quando um determinado personagem aparece, a visão de Elissa sobre o mundo e sobre ela própria é desestruturada.
A construção dos personagens de Nikelen, principalmente as fortes mulheres descritas, é fantástica. Não apenas a protagonista, como os personagens secundários têm personalidades críveis e complexas – com defeitos e qualidades – e, principalmente, conseguem provocar ao leitor afeição, repulsa e às vezes ambos.
A protagonista da trama, Elissa Til, é arrastada para o meio de uma guerra civil marcada pela violência, onde os líderes do governo, além de negligenciar todas as visíveis transformações que estão ocorrendo no planeta por conta da ganância, permitem ainda que o povo sofra com o descaso. A desigualdade social é alarmante, onde a elite domina os recursos básicos e as classes inferiores são as mais afetadas.
Além de todo o caos que a envolve, o fato dela ser mulher em uma sociedade que espera que se encaixe em um papel pré-determinado também faz com que passe por provações.
Muitas vezes marcada pela impulsividade e outras pela sensação de impotência, ela acaba se transformando em dona da próprio história após ser levada – diversas vezes relutante – por uma sucessão de fatores a rumos inesperados. Toda a ascensão de seu papel na sociedade e sua importância em meio a guerra – algumas horas tida como heroína e outras como criminosa – acontece de forma gradativa, e é interessante acompanhar a trajetória de uma simples curandeira à uma líder.
Entre os demais personagens, com personalidades e motivações próprias, é necessário destacar a irmã de Elissa, Teodora, e Tyla. Ambas são símbolos de transgressão às regras sociais impostas, sendo a primeira uma genial científica e a segunda a dona de um bordel. Apesar de terem destaque, muito do seus núcleos narrativos se perdem por conta da centralização da história pela visão da protagonista. Contudo, o apresentado é suficiente para ter simpatia e torcer por tão fascinantes mulheres que possuem seu próprio modo de lidarem com tudo isso.
O leitor vai desvendando o cenário e a construção social e política da narrativa ao passo que a história caminha. Toda a estrutura da República Tríplice, as motivações do movimento independentista, a geografia e cultura dos lugares vão sendo revelados em uma narrativa fluída, que se permite tempo de acontecer e impressionantemente apresenta pouco mais de 300 páginas.
Cheia de camadas, a história consegue dar profundidade a temas como a responsabilidade do homem perante a natureza, questões de gênero, o papel da imprensa na sociedade, a ambiguidade dos homens e tantos outros, podendo facilmente servir para paralelos com nossa própria realidade.
Com uma narrativa completa, Viajantes do Abismo consegue surpreender ao aproximar o leitor de um destino assustador, mas possível. Se arrisque e mergulhe no abismo!
Nikelen Witter escreve desde criança, mas começou a publicar em 2011. De lá para cá sua produção tem sido reconhecida como parte da chamada “Terceira Onda” da Ficção Fantástica no Brasil. É autora de Territórios Invisíveis (Avec, 2017) – finalista do Prêmio Argos de melhor romance fantástico (2013); Guanabara Real e a Alcova da Morte (Avec, 2017) com Enéias Tavares e AZ Cordenonsi – Vencedor do Prêmio Le Blanc de melhor romance fantástico nacional (2018) e do prêmio AGES de melhor romance juvenil (2018), e Viajantes do Abismo (Avec, 2019); além de inúmeros contos em coletâneas, entre eles “Mary G.”, finalista do prêmio Hydra (2014). Desde 2016, é agenciada pela Increasy Consultoria Literária.
É também historiadora, pesquisadora e professora universitária. Mora em Santa Maria, RS, com o marido, o filho e as gatas Felícia e Hermione.
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