Criado por Francylene Silva - 21 de dezembro de 2018 às 20:46
E se aquilo que se posta a sua frente alterasse a visão que você tem do mundo? E se abalasse ou despertasse aquilo que acredita? Aqueles que são inflexíveis, grandes revelações podem atormentar.
O Santo Sangue, HQ de Laudo Ferreira e Marcel Bartholo, conta a história de Lucem, uma jovem que após começar a proporcionar curas através da utilização de seus fluidos menstruais, passa a ser tida como santa no local. Pensando ser um homem o responsável pela transformação da moça, o pai de Lucem contrata um conhecido matador profissional para dar fim a vida dele.
A história, assinada por Laudo Ferreira, é cercada de um misticismo pouco trabalhado em produções nacionais, que se vale de um contexto regional, interiorano, expressado em linguagem e cenário.
Através da descrição das curas de Lucem e principalmente, de como tal dádiva ou maldição começou, sempre acentuando essa dualidade, vão se revelando os personagens tais como símbolos. Naturalmente, eles, que parecem contar a história sem necessitar de intermédios, assumem um ângulo da misteriosa narrativa.
Lucem, Vérnio, Contreiro e bruxa, personagens centrais da trama, tem na forma como lidam com o desconhecido os elementos que os descrevem e diferem: A fé, o pragmatismo, a intolerância e o místico.
A santa Lucem abraça a singularidade de suas habilidades curativas sem questionar. Acredita no papel que lhe é imposto, nunca questionando-o, mesmo sendo um fator modificador em sua vida.
Vérnio, guiado pelo pensamento racional e prático procura se distanciar de todo misticismo que serve de cenário para seu próximo trabalho.
Contreiro, por não ter explicações para o acontecido. Mas se sentindo profundamente afetado por ele, o repudia veementemente.
Já a Bruxa, que merece destaque dentre eles, representa por si só o místico. A todo momento, indicando uma presença onipresente e esclarecida, uma espécie de espectadora de um filme cujo final ela sabe, mas que não vai ajudar você a entender.
Os traços marcados e angulados e as cores terrosas de Marcel Bartholo possuem claras referências à arte de Cândido Portinari, já confirmadas em declarações do desenhista sobre seu processo criativo. Sendo totalmente feita através de pintura digital de uma forma que aproxima do visual da pintura em giz pastel oleoso, ao qual Marcel trabalha regularmente, a arte apresenta uma força bruta cujo vermelho, da revelação, da cura, do desconhecido, possuem realce.
A HQ não possui mensagens ou intenções finais definidas. A alguns dos personagens fica velado até mesmo o por quê de suas ações. A história é daquelas que parecem transmitidas pela oralidade e que entre mudanças e contextualizações se perpetua.
No mundo tudo pode realmente ter cura, mas nem todos estão preparados para entender a complexidade disso.
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